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Ginatsu
Felipe Tiago Campos

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Capítulo 1 - O Aniversário do lorde Krause

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Capítulo 1 - O Aniversário do lorde Krause

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09/06/842 – 23:37

Aswad Morigak suspirou aliviado em seu quarto na ferraria dos Morigak. Sua obra-prima estava pronta. Depois de dois anos trabalhando quase que diariamente, ele conseguiu terminar de forjar uma adaga mágica, a qual batizou de Shensuur. Ao mesmo tempo, em que queria ter ela para si, também tinha que entrega-la ao comprador o mais rápido possível. Com o pagamento dessa encomenda, conseguiria viver tendo tudo do bom e do melhor pelos próximos anos. Apesar de que ele pretendia gastar bastante no evento do dia seguinte.

Ainda de noite ele saiu de casa, apenas com suas roupas esfarrapadas de ferreiro e a adaga mágica. Correu pelo estreito labirinto de ruas de Irëng o mais rápido que pôde em direção à estalagem “Sonho do Anão”, era ali que ele se encontrava com Caedes, o homem era de uma raça que ele não conhecia, tinha a pele extremamente clara, o cabelo azul-escuro quase preto e os olhos alaranjados, havia sido ele que encomendara a adaga.

Entrou devagar na estalagem, embora nervoso e impaciente, acenou para o anão que cuidava do bar às moscas e seguiu pelo corredor de madeira em direção ao quarto de Caedes. Ao se aproximar do aposento, percebeu que a porta estava entreaberta e, como de costume, encostou-se à porta para ouvir o que acontecia do lado de dentro.

—Eu sei. Eu sei. O plano está nos conformes, só preciso de um tempo para ajeitar as coisas depois do evento… — Falou a já conhecida voz de Caedes, ele parecia calmo ao contrário do homem com quem conversava.

—Você está relaxado demais, colega! Não tem medo do que pode dar errado? — Sua voz era fanha e nasal.

—Nada vai dar errado, Mardo. Logo, logo, Irëng estará afundada em terror — Ele começou a rir em seguida.

—Assim eu espero… Ei! A porta não está fechada. — Não se preocupe, não há ninguém que possa nos atrapalhar. Mas se isso te incomoda tanto assim…

Aswad ouviu o homem se aproximando e correu para o lado de fora da estalagem com o coração acelerado e o suor escorrendo frio por sua pele roxa. Engoliu a seco, enquanto olhava para o item mágico em suas mãos. Shensuur havia sido feita com a utilização de vários pergaminhos mágicos, a adaga dava ao seu portador a capacidade de falar em nove idiomas diferentes, se Caedes utilizasse-a para o mal, expandir sua influência seria o menor dos problemas.

O tiefling não se importava com ideais como salvação mundial ou mesmo respeito pelos outros, ora, ele roubava materiais para construir armas sempre que precisava, mas se teve uma coisa que seu pai adotivo o ensinou foi: Nunca entregue um trabalho para alguém que não o merece. Aswad tinha ouvido apenas uma vez a história de como um sósia havia usado o martelo construído e entregue pelo próprio Gudzal Morigak para assassinar a família do golias.

Não. Ele não podia de forma alguma entregar a adaga para Caedes. Entretanto, também não podia voltar para casa sem fazer nada. Aswad respirou fundo e da maneira mais furtiva que conseguiu, entrou na estalagem de novo, determinado a acabar com a vida do comprador ali e agora. Passou despercebido, se esgueirando pela parede circular do grande hall de entrada assim que o barman virou de costas e seguiu pelo corredor.

A porta que dava ao quarto estava fechada. Ele ficou a uma distância que julgou ser segura, esperando que um dos dois homens saísse do quarto, de preferência o anão, mas conforme o tempo foi passando decidiu se aproximar. Encostou o ouvido na porta e percebeu que não havia um barulho sequer saindo dali. Ele tinha experiência em invadir locais desse tipo, por bons motivos, claro. Aswad arriscou, girou a maçaneta e após abrir com cuidado a porta entrou calma e silenciosamente no quarto.

O aposento, apesar de ser o melhor que a estalagem podia proporcionar, não era tão luxuoso assim. Logo ao lado da entrada, havia uma grande mesa de madeira com dezenas de folhas e pergaminhos espalhados, escritos em idiomas os quais ele não conseguia nem mesmo reconhecer os caracteres. Uma cama grande e bem arrumada estava disposta no centro do local, de costas para a varanda. De resto, havia apenas um grande armário de madeira perto da porta, sem sinal de qualquer pessoa ali. O tiefling não perdeu tempo, tirou Shensuur da cintura e disse em voz alta:

– Ràsmii.

A adaga, que até então parecia uma arma comum, se transfigurou nas mãos dele. Sua empunhadura encolheu, sua guarda se dividiu em três que eram pontiagudas e voltadas para frente e a lâmina tomou uma forma irregular e esverdeada, como se fosse feita de algum tipo de esmeralda ou outra pedra preciosa. A partir de então, enquanto tocasse o objeto, Aswad só poderia falar, ler e entender o idioma dos phumans, o principal contraponto do item era este, ele lhe dava o conhecimento sobre um idioma, mas restringia sua capacidade de usar outros.

Sorriu satisfeito ao ver sua criação funcionando e foi checar os papéis sob a mesa, as letras continuavam sem fazer sentido, ele conferiu pergaminho após pergaminho, página após página e cinco minutos depois, a adaga voltou ao normal. Aswad olhou em volta e no corredor, quando teve certeza de que ainda tinha tempo ativou outra forma da adaga:

— Mhanna.

A pequena faca alterou sua aparência novamente, dessa vez a lâmina ficou azul-claro e curva, sua empunhadura tinha a forma retorcida e era ainda mais clara, quase transparente. Entretanto, o que importava era que ele agora podia entender psearen, então ele voltou à checagem dos papéis. Nada, não teve progresso algum, haviam alguns mapas ali também, mas pelos seus formatos não pareciam ser da cidade ou de qualquer lugar que ele conhecesse. O tiefling já se preparava para usar a adaga mais uma vez quando foi surpreendido por passos no corredor.

Aswad estremeceu, pegou um dos mapas, colocou no bolso da roupa e se escondeu dentro do armário, tomando o cuidado de deixar uma fresta aberta para enxergar quem quer que entrasse ali.

Segundos após, um homem idoso com o cabelo loiro e escasso preso por um rabo de cavalo entrou devagar na sala, empurrou a porta para trás, sem se preocupar em fechá-la, ajeitou seu roupão verde-escuro e foi olhar os papéis.

Aswad não conhecia o homem e aproveitou enquanto ele estava distraído arrumando a bagunça para se aproximar furtivamente pelas costas e colocando a adaga em seu pescoço com pressão suficiente para que o velho soubesse que sua vida estava em risco ao menor movimento.

—Os papéis. O que tá escrito neles? — Perguntou o tiefling, sua voz era rouca, mas clara o suficiente para que ele conseguisse sussurrar sem problemas, ainda assim, ele comumente errava palavras ou se confundia com termos, ironicamente, era péssimo com idiomas.

— Eu não sei, não sei ler essa língua. Nunca a vi na minha vida. — O homem respondeu, o medo era palpável em sua voz.

—De onde vieram esses papéis. — Questionou ele pausadamente, queria assustar o velho e parecia ter conseguido, já que ele respondeu suando e gaguejando.

—Eu… Me mandaram trazê-los… Entregar pra uma pessoa.

—Pra quem?

Aswad pressionou mais a adaga no pescoço do homem, fazendo com que uma leve gota de sangue escorresse. Para sua surpresa, o velho pisou em seu pé, tentando em vão causar uma distração e escapar. Sentindo a pisada completamente ineficaz, Aswad usou a arma para rasgar o pescoço do homem, se arrependendo quase que instantaneamente, não por tê-lo matado, mas por ter encharcado completamente os papéis com sangue.

Ele ouviu mais passos vindo pelo corredor e sem tempo para limpar a bagunça, pegou o máximo que pôde dos pergaminhos e saiu pela janela. Em um único salto se lançou da varanda para o telhado da casa mais próxima, não fez o mínimo barulho ou derrubou uma das folhas sequer. O corpo do homem seria descoberto, mas Aswad não.

Foi pelo alto dos telhados até a ferraria dos Morigak. Ao chegar, percebeu que Gudzal já tinha ido dormir e foi direto para seu quarto, colocou os papéis sobre a mesa, tomou banho e após testar as outras seis formas da adaga, adormeceu sem conseguir entender uma palavra do que estava escrito nos documentos.

10/06/842 – 10:55

O tiefling acordou de manhã e o sangue seco sobre os papéis não ajudou na hora de tentar relê-los. O único papel que ainda estava em boas condições mostrava um amuleto preto e redondo parecido com um disco, mas o resto era ilegível. Normalmente ele tentaria analisa-los por mais tempo, talvez levar até um especialista, mas aquele era um dia especial.

Lorde Berndt Krause, principal autoridade da cidade de Irëng, comemoraria seus 290 anos e o castelo dos Krause estaria aberto a visitas, fossem comerciantes, nobres ou camponeses e o evento começaria com um grande show no coliseu interno do castelo, para que todos tivessem como aproveitar.

Aswad já estava há mais de dois anos trabalhando sem parar, ele definitivamente precisava de um dia de folga, os papéis podiam esperar até amanhã. Ele os escondeu na gaveta de sua escrivaninha e foi até a Sonho do Anão gastar suas economias enquanto esperava o horário da comemoração.

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